terça-feira, 25 de outubro de 2011

Medicina

O governo brasileiro acaba de resolver (!) o problema da falta de médicos em áreas de extrema pobreza e periferias.

Após inúmeras reuniões em Brasília, veio a decisão: “Residência médica com bônus”.

Essa gente, como sempre, tem ideias geniais. No entender deste médico do interior, que por longos anos percorreu os grotões, não só do nosso Estado, como de grande parte da Amazônia, esse programa lançado pelo MEC - Ministério da Saúde, não vai prestar.

A proposta do governo para a qualificação desse profissional de saúde, que irá prestar socorro aos mais necessitados do país, é simplesmente vergonhosa.

Em outras áreas de trabalho, o governo adota condutas corretas com relação aos profissionais de nível superior que irão para as pequenas cidades: eles são escolhidos por concursos públicos e amparados por um estatuto de cargos e carreiras, com salários dignos.

Exemplo deste fato encontra-se na carreira dos magistrados.

No caso dos médicos, o governo oferece bônus na prova de Residência Médica de até 20%!

Todo brasileiro morador das áreas pobres e os estudantes de medicina, sabem o que é necessário para fixar um médico nessas regiões.

É imprescindível, em primeiro lugar, que o governo invista o mínimo necessário para fornecer condições de trabalho a esses profissionais.

Recentemente, vimos no Estado mais rico desta nação centenas de ambulâncias novas e super equipadas, paradas no pátio de uma garagem.

Os municípios, em sua grande maioria, têm necessidade dessas viaturas, mas, não têm condições financeiras para usufruir desse verdadeiro presente de grego doado pelo governo federal.

O tão falado Programa Saúde da Família (PSF), em muitas prefeituras, inclusive das capitais, como a nossa, não funciona com a necessária resolutividade por absoluta falta de recursos de toda ordem.

Certa ocasião, conversando com um prefeito, ele me disse que iria triplicar o número de PSF. Queria saber a minha opinião. Disse-lhe que, se todos os PSF fossem fechados, do jeito como estavam funcionando, ele precisaria de um grande investimento na mídia para avisar do fechamento dos mesmos. O PSF, com raríssimas exceções, atinge seu objetivo.

Contratar médicos para trabalhar em locais que não ofereçam o mínimo de retaguarda necessária para o bom desempenho do profissional, é jogar dinheiro fora. A principal dela é a laboratorial.

Sem ela fica difícil, e muitas vezes impossível, a simples hipótese diagnóstica. Sem falar da falta rotineira dos medicamentos essenciais.

O bônus oferecido pelo governo em um exame tão concorrido como é o de Residência Médica, não me parece uma atitude ética.

Considero uma punição aos alunos que farão o mesmo exame em condições desiguais, em um projeto que todo mundo sabe que não vai dar certo.

Fixação do médico no interior não se faz com bônus no concurso da Residência Médica e muito menos com um contrato temporário por dois anos de trabalho.

Repito: é enganosa a contratação de um médico em locais sem as mínimas condições de trabalho, com salários não estimulantes, sem nenhuma garantia sobre o futuro profissional desse jovem e, o que é pior, tendo que atender quem o político mandar.

Essa é a realidade dos nossos grotões, tão necessários à manutenção do poder.

O Brasil precisa de simplicidade nas ações governamentais e, não, desses espetáculos estatísticos.

O Brasil possui cerca de cento e oitenta escolas de medicina. Os médicos, para se fixarem no interior, esperam do poder público, além do que foi dito acima, um plano de cargos e carreiras.

Como disse recentemente a presidente, quando lhe cobraram soluções para resolver a situação catastrófica da saúde pública no Brasil, ela respondeu que lhe apontassem os recursos.

Continuou dizendo que aqueles que dizem que o problema da nossa saúde pública não é de recursos e sim gestão, são demagogos e mentem.

A fixação de médico no interior passa por esse gargalo.

Residência com bônus? Fogos de artifícios.



Gabriel Novis Neves

04-09-2011

* Publicado simultaneamente no www.bar-do-bugre.blogspot.com

terça-feira, 18 de outubro de 2011

O FUTURO DA MEDICINA

Mesmo sendo o mais otimistas dos otimistas vejo com muita preocupação o futuro da medicina no nosso país.

O governo federal há tempos jogou a toalha com relação à precária situação da saúde pública do Brasil.

O Ministério da Saúde ficou restrito à distribuição de camisinhas no Carnaval, e a divulgar as centenas de milhares delas fornecidas.

Os autores dos programas federais são burocratas apadrinhados que, das suas salas refrigeradas, fazem o planejamento da saúde desta nação de mais de oito milhões de quilômetros quadrados.

Muitos desses sábios nunca tiveram o mínimo contato com o funcionamento prático do melhor sistema que criaram no papel: o SUS (Sistema Único de Saúde).

Os resultados são sentidos nos municípios. A base do sistema ideal proposto pelo SUS estava todo centrado no reforço e terminalidade da rede de atenção primária de saúde com as suas ações permanentes no atendimento a população.

Só funciona no papel, e durante a campanha política.

O Programa Saúde da Família, como está implantado, é um plano inútil e não atende às aspirações da população. É mais um posto de triagem de pacientes para as policlínicas e para o nosso sempre salvador, apesar dos pesares, Pronto Socorro.

Para explicar os problemas do subfinanciamento para a saúde as nossas autoridades jamais se pronunciaram e jogam a culpa numa tal de gestão!

Frequentemente eu ouço os nossos barões dizendo: “o problema da saúde não é falta de dinheiro. É problema de gestão”, e logo mostram os culpados.

Médicos não são consultados para o preenchimento de cargos eminentemente técnicos, que são ocupados por cotas do programa político - loteamento do poder.

O bom secretário de Saúde é aquele que se anula e executa as mesquinharias dos poderosos.

Durão, o governo não usa da sinceridade e da lealdade nesse momento e afirma para a população via Informe Publicitário, que resolverá todos os problemas de saúde do Estado a preços módicos.

Importaram uma empresa de Pernambuco - dizem com problemas técnicos, para a gestão dessa diabólica matemática de resultados sem recursos, sem investimento no treinamento dos profissionais de saúde, e a sua adesão à aventura proposta.

Afirmam que este Estado não terá mais problemas hospitalares graças a essa milagrosa e competente Organização Social de Saúde - a famosa OSs.

Acontece que não é isso que vemos diariamente pela TV sobre a saúde na terra do frevo.

Finalmente a nossa desfalcada rede privada que, apesar de ser tratada como vilã pelas nossas autoridades é a única procurada por eles, como pacientes.

Só em Cuiabá, nos últimos dez anos, o governo fez sumir (!) cerca de mil leitos.

A população da ex-Cidade Verde aumentou, assim como a de todo o Estado, que acaba procurando os serviços médicos da capital.

Conversar com o governo do Estado sobre a conclusão do Hospital de Clínicas, iniciado em 1983, e com a obra em esqueleto, nem pensar.

Não sei a razão, mas os nossos governantes têm traumas quando o assunto é hospital. Este assunto também, só é lembrado nas campanhas políticas.

As grandes unidades de exames laboratoriais já não pertencem mais a este gigante Estado.

A investida agora está centrada na aquisição dos nossos hospitais de alta complexidade.

E o governo do Estado deu o grande exemplo entregando a sua rede de hospitais regionais, e outros, às OSs.

Diante desse rápido quadro, dá ou não para ficar preocupado com o futuro da nossa medicina?

Esta é uma fotografia real da nossa medicina atual.

E os futuros médicos que estão iniciando agora a outrora charmosa e reverenciada profissão de médico?

Com certeza serão escravos de poderosos grupos econômicos, cujo único objetivo é o lucro financeiro, em detrimento da qualidade dos serviços prestados.

Numa segunda etapa, as universidades fecharão os seus cursos de medicina por falta de alunos.

Melancólico futuro da nossa medicina, se tudo continuar a ser continuidade neste país da Copa.


Gabriel Novis Neves

15-10-2011

* Publicado simultaneamente no www.bar-do-bugre.blogspot.com