O governo brasileiro acaba de resolver (!) o problema da falta de médicos em áreas de extrema pobreza e periferias.
Após inúmeras reuniões em Brasília, veio a decisão: “Residência médica com bônus”.
Essa gente, como sempre, tem ideias geniais. No entender deste médico do interior, que por longos anos percorreu os grotões, não só do nosso Estado, como de grande parte da Amazônia, esse programa lançado pelo MEC - Ministério da Saúde, não vai prestar.
A proposta do governo para a qualificação desse profissional de saúde, que irá prestar socorro aos mais necessitados do país, é simplesmente vergonhosa.
Em outras áreas de trabalho, o governo adota condutas corretas com relação aos profissionais de nível superior que irão para as pequenas cidades: eles são escolhidos por concursos públicos e amparados por um estatuto de cargos e carreiras, com salários dignos.
Exemplo deste fato encontra-se na carreira dos magistrados.
No caso dos médicos, o governo oferece bônus na prova de Residência Médica de até 20%!
Todo brasileiro morador das áreas pobres e os estudantes de medicina, sabem o que é necessário para fixar um médico nessas regiões.
É imprescindível, em primeiro lugar, que o governo invista o mínimo necessário para fornecer condições de trabalho a esses profissionais.
Recentemente, vimos no Estado mais rico desta nação centenas de ambulâncias novas e super equipadas, paradas no pátio de uma garagem.
Os municípios, em sua grande maioria, têm necessidade dessas viaturas, mas, não têm condições financeiras para usufruir desse verdadeiro presente de grego doado pelo governo federal.
O tão falado Programa Saúde da Família (PSF), em muitas prefeituras, inclusive das capitais, como a nossa, não funciona com a necessária resolutividade por absoluta falta de recursos de toda ordem.
Certa ocasião, conversando com um prefeito, ele me disse que iria triplicar o número de PSF. Queria saber a minha opinião. Disse-lhe que, se todos os PSF fossem fechados, do jeito como estavam funcionando, ele precisaria de um grande investimento na mídia para avisar do fechamento dos mesmos. O PSF, com raríssimas exceções, atinge seu objetivo.
Contratar médicos para trabalhar em locais que não ofereçam o mínimo de retaguarda necessária para o bom desempenho do profissional, é jogar dinheiro fora. A principal dela é a laboratorial.
Sem ela fica difícil, e muitas vezes impossível, a simples hipótese diagnóstica. Sem falar da falta rotineira dos medicamentos essenciais.
O bônus oferecido pelo governo em um exame tão concorrido como é o de Residência Médica, não me parece uma atitude ética.
Considero uma punição aos alunos que farão o mesmo exame em condições desiguais, em um projeto que todo mundo sabe que não vai dar certo.
Fixação do médico no interior não se faz com bônus no concurso da Residência Médica e muito menos com um contrato temporário por dois anos de trabalho.
Repito: é enganosa a contratação de um médico em locais sem as mínimas condições de trabalho, com salários não estimulantes, sem nenhuma garantia sobre o futuro profissional desse jovem e, o que é pior, tendo que atender quem o político mandar.
Essa é a realidade dos nossos grotões, tão necessários à manutenção do poder.
O Brasil precisa de simplicidade nas ações governamentais e, não, desses espetáculos estatísticos.
O Brasil possui cerca de cento e oitenta escolas de medicina. Os médicos, para se fixarem no interior, esperam do poder público, além do que foi dito acima, um plano de cargos e carreiras.
Como disse recentemente a presidente, quando lhe cobraram soluções para resolver a situação catastrófica da saúde pública no Brasil, ela respondeu que lhe apontassem os recursos.
Continuou dizendo que aqueles que dizem que o problema da nossa saúde pública não é de recursos e sim gestão, são demagogos e mentem.
A fixação de médico no interior passa por esse gargalo.
Residência com bônus? Fogos de artifícios.
Gabriel Novis Neves
04-09-2011
* Publicado simultaneamente no www.bar-do-bugre.blogspot.com